Sei que é uma estranha combinação, mas no final tudo vai se esclarecer. Vamos começar com Jimmy, o funcionário da concessionária de veículos. Toda noite, por volta das 8 horas, ele passava pelo 7-Eleven e pedia para a atendente conferir uma pilha de “raspadinhas”. Esse termo, sem dúvida, é o melhor para traduzir as loterias de “scratch-off” ou os “scratching-tickets” que temos por aqui.
Não era uma quantidade absurda, mas também não eram poucas. Na fila, aquela cara de impaciência de muitos, com pressa de voltar para casa ou para ir onde quer que tenham de ir. Jimmy normalmente ganhava o direito ao mesmo bilhete, às vezes um prêmio modesto, nada que pudesse mudar sua vida nem sequer por uma semana. Os resultados não impressionavam, o que me impressionava, no entanto, era a assiduidade do Jimmy. Não falhava um dia sequer. Ao saber dos resultados não mostrava nem rancor por não ter ganhado, nem decepção, talvez, no máximo, um longínquo ar de esperança misturada com resignação. Esta era a vida do Jimmy. Comprava algo no mesmo caixa para o jantar, como todos que estavam na fila e ia para casa.
Era vendedor, provavelmente vendia seus dois ou três carros e voltava para casa à noitinha. Jimmy tinha um rosto familiar e por alguns meses eu tentei descobrir por quê. Finalmente um dia decifrei a charada. Estava assistindo mais uma vez ao filme “Lethal Weapon” (“Máquina Mortífera”) e lá estava: era o próprio Danny Glover, o policial parceiro da personagem de Mel Gibson, no filme. Agora nosso título acima está explicado.
O outro mistério que era difícil de entender era o porquê daquela assiduidade. Anos a fio, todo dia comprando as tais loterias, com resultado quase nenhum? Pensei muito sobre o assunto e cheguei a uma conclusão. Todos os dias Jimmy vendia carros novos, ou seja, vendia realização de sonhos para as pessoas. Eu não sei quais eram os sonhos de Jimmy, mas sei que tinha muitos. Nem importava ganhar, importava manter a fantasia, a esperança. Jimmy havia escolhido uma forma de materializar a procura da sua. Todo dia ele comprava pedacinhos de seu devaneio...
Todos nós também, todos os dias, cada um à sua maneira, estamos “comprando”, de alguma forma, nossas “raspadinhas de sonho”...
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Published on e-Stories.org on 01/16/2018.
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